Eu já em 1973, ao regressar do serviço militar obrigatório em Moçambique, deixei triste algumas pessoas do meu coração por dizer que não tinha tido nesses 24 meses o sentimento da “saudade” mas sim que em muitos, mesmo muitos, momentos senti a falta deles. E talvez este modo de estar na vida tenha sido alguma consequência de o lugar onde mais se vê a palavra “saudade” ser nos cemitérios e quase sempre acompanhada do adjectivo “eterna” que ainda a carrega mais negativamente. Talvez por isso eu não gosto de ter saudades de pessoas. E para a substituir quando sinto falta de alguém ou lembro um agradável momento do passado prefiro utilizar a palavra “nostalgia”. E pronto está clarificado o que vou escrever a seguir.
Hoje, depois de um almoço em casa bem acompanhado pela minha esposa, refestelei-me no sofá e comecei a ler o JN (ainda sou dos arcaicos que ainda leem jornais no papel) e vi uma pequena notícia publicada numa página interior relacionada com a vida social.
E entrou em mim a dita NOSTALGIA. Uma figura pública anunciou que a sua Mãe tinha morrido e a viagem final do seu corpo seria dali a uma hora em Matosinhos.
Naquele momento a minha vida “andou para trás” quase 70 anos e peguei no PUZZLE e vi que lhe estava a cair uma peça. E o que me surpreendeu não terá sido a sua morte ainda que a não esperasse mas sim o que “bateu em mim”. Desta vez foi diferente das vezes em que partiu gente de quem eu gostava muito e com quem convivia e em que eu tive mesmo um grande sentimento de perda. Não, desta vez foi uma peça de um PUZZLE que veio à minha cabeça sem nunca o ter visto ou imaginado antes.
Quando crianças brincávamos na rua em terra batida (onde não havia trânsito) vi o seu namoro com um Amigo meu com quem se casou, bonita, elegante, muito alegre, viveu muita a vida e, sendo mais velha um ano e meio que eu, fez-se mulher muito mais cedo do que eu deixei de ser menino. Perdi-lhe o contacto há mais de 30 anos mas sabia algumas coisas do seu percurso. Terá sido uma grande amizade? Não, não foi por certo, mas foi uma amizade de crianças e portanto uma amizade pura, profunda e muito sincera. Não vou relatar nada da nossa amizade porque nada é relevante mas recordo que houve nos anos 60 uma traineira registada em Leixões com o seu nome. Deixou dois filhos que são figuras publicas do nosso país que conheci como meninos pequenos mas que não “conheço” pessoalmente agora que são adultos. E contei-vos isto por “nostalgia” e por ter sentido uma sensação estranha em mim: não tendo contacto há tanto tempo com Ela, tive pela 1ª vez a noção de que me foi roubada uma peça do meu nunca antes imaginado PUZZLE de há sessenta e tal anos. E já escrevi muito sem saber se foi pela minha “nostalgia” ou se foi para a minha Amiga que a despoletou. Mas queria que fosse só uma simples homenagem como foi maravilhosa e simples a cerimónia da sua última viagem.
Até um dia LAURA MARIA.